Os espelhos
O que é um espelho? Não existe a palavra espelho – só espelhos, pois um único é uma infinidade de espelhos. Em algum lugar do mundo deve haver uma mina de espelhos?
Não são preciso muitos para se ter a mina faiscante e sonambúlica: bastam dois, e um reflete o reflexo do eu o outro refletiu, num tremor que se transmite em mensagem intensa e insistente ad infinitum, liquidez em que se pode mergulhar a mão fascinada e retira-la escorrendo de reflexos, os reflexos dessa dura água.
O espelho é o espaço mais fundo que existe – É coisa mágica: quem tem um pedaço quebrado já poderia ir com ele meditar no deserto. De onde também voltará no vazio, iluminado e translúcido – e com o mesmo silêncio vibrante de um espelho.
Quem olha um espelho conseguindo ao mesmo tempo isenção de si mesmo, quem consegue vê-lo sem se ver, quem entende que a sua profundidade é ele ser vazio, quem caminha para dentro de seu espaço transparente sem deixar nele o vestígio da própria imagem – então percebeu o seu mistério.”
Clarice Lispector < “Para não esquecer” (Rio de Janeiro, 1999, p-12-13) Texto modificado e resumido.
O que é um espelho? Não existe a palavra espelho – só espelhos, pois um único é uma infinidade de espelhos. Em algum lugar do mundo deve haver uma mina de espelhos?
Não são preciso muitos para se ter a mina faiscante e sonambúlica: bastam dois, e um reflete o reflexo do eu o outro refletiu, num tremor que se transmite em mensagem intensa e insistente ad infinitum, liquidez em que se pode mergulhar a mão fascinada e retira-la escorrendo de reflexos, os reflexos dessa dura água.
O espelho é o espaço mais fundo que existe – É coisa mágica: quem tem um pedaço quebrado já poderia ir com ele meditar no deserto. De onde também voltará no vazio, iluminado e translúcido – e com o mesmo silêncio vibrante de um espelho.
Quem olha um espelho conseguindo ao mesmo tempo isenção de si mesmo, quem consegue vê-lo sem se ver, quem entende que a sua profundidade é ele ser vazio, quem caminha para dentro de seu espaço transparente sem deixar nele o vestígio da própria imagem – então percebeu o seu mistério.”
Clarice Lispector < “Para não esquecer” (Rio de Janeiro, 1999, p-12-13) Texto modificado e resumido.
10 comentários:
Clarice Lispector é sempre uma vertigem...
Bela imagem que você escolheu, JU!
Bjs.
REFLEXOS espelham espelhos!
ESPELHOS com reflexos !
Espelhos+espelhos= infinitos reflexos!Refletem espelhos!
JU, entendi a Mensagem e adorei a Foto...!
Ah, e a Música...
Perfeito.
Bjs
Gaspar de Jesus
Magníficas as aguarelas.
Sonia, concordo... sempre uma boa e misteriosa vertigem.
obrigado pelo comentário.
bjs.
Ju gioli
Eduardo,
ad infinitum
espelhos.
Gaspar,
sempre bem vindo as suas sensíveis
opiniões.
Jose,
aquarelas são sempre um fazer e refazer...
obrigado à todos pelos comentários
bjs.
JU Gioli
Há dias em que queria ser espelho, entrar na minha imagem, ser espelho de mim mesmo, ver o infinito do outro lado...
Boas imagens. Texto excelente. Um descanso.Bom fim de semana.
Os espelhos são sempre fascinantes, a imagem e o texto da Clarice Lispector são maravilhosos. E a música também, é deliciosa...é sempre um grande prazer passar por aqui.
Beijos e um bom fim de semana.
Querida te deixo aqui,um poema que em determinado momento da vida ...diz tanto...
Silvia Plath... The Mirror
I am silver and exact. I have no preconceptions.
Whatever I see I swallow immediately
Just as it is, unmisted by love or dislike.
I am not cruel, just truthful -
The eye of a little god, four cournered.
Most of the time I meditate on the opposite wall.
It is pink, with speckles. I have looked at it so long
I think it is a part of my heart. But it flickers.
Faces and darkness separate us over and over.
Now I am a lake. A woman bends over me,
Searching my reaches for what she really is.
Then she turns to those liars, the candles or the moon.
I see her back, and reflect it faithfully.
She rewards me with tears and an agitation of hands
I am important to her. She comes and goes.
Each morning it is her face that replaces the darkness.
In me she has drowned a young girl, and in me an old woman
Rises toward her day after day, like a terrible fish.
Espelho
Sou prateado e exato. Não tenho preconceitos.
Tudo o que vejo engulo imediatamente
Do jeito que for, desembaçado de amor ou aversão.
Não sou cruel, apenas verdadeiro -
O olho de um pequeno deus, de quatro cantos.
Na maior parte do tempo medito sobre a parede em frente.
Ela é rosa, pontilhada. Já olhei para ela tanto tempo,
Eu acho que ela é parte do meu coração. Mas ela oscila.
Rostos e escuridão nos separam toda hora.
Agora sou um lago. Uma mulher se dobra sobre mim,
Buscando na minha superfície o que ela realmente é.
Então ela se vira para aquelas mentirosas, as velas ou a lua.
Vejo suas costas, e as reflito fielmente.
Ela me recompensa com lágrimas e um agitar das mãos.
Sou importante para ela. Ela vem e vai.
A cada manhã é o seu rosto que substitui a escuridão.
Em mim ela afogou uma menina, e em mim uma velha
Se ergue em direção a ela dia após dia, como um peixe terrível.
translated by André Cardoso
beijos...
Maria Augusta, gosto deste temas sobre Espelhos. A arte e a literaturas ,nos trazem essas indagações sobre esse objeto misterioso e sutil.
Obrigado pelo comentário.
Expresso, qual espelho refletiria exatamente o que somos???
vamos procurando, não é mesmo.
Vi, lindo esse poema da Silvia Plath, somando-se a esse misterioso espelho, as infinitas possibilidades de reflexos.
Obrigada
JU Gioli
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